2008/09/07

Exposição: FOTOLITOS — «Esta fotografia é uma pedra», de Pedro da Rocha Calhau

cartaz
A técnica é simples. De facto, não existe propriamente técnica. É mais um processo. Um método. De olhar, mais do que de fazer. De estar.
Em primeiro lugar é preciso fugir da cidade. De todas, mas especialmente desta, que se presta tanto a fugir-se dela. Tomemos o rumo das montanhas, convenientemente próximas mas a um mundo de distância.
Uma vez lá em cima, convirá ter trazido uma câmara fotográfica. Nada de sofisticado, pelo menos certamente não neste caso: uma qualquer câmara digital, compacta, de bolso, daquelas que pouco mais servem do que para registar o momento e o local — «Neste dia estive aqui» —, o cliché pessoal com a paisagem como fundo.
Até que o protagonismo passa de nós para a paisagem: a explosão de cor da Primavera, os cadáveres carbonizados de florestas passadas a recortarem-se contra o azul do céu ou o amarelo impossível das mimosas, a vertigem dos vales abruptos.
O passo seguinte, inconsciente quando pela primeira vez foi dado, foi uma mudança de escala. Já não a paisagem, mas as suas partes constituintes. Da macroestrutura para a microestrutura, digamos assim. Uma árvore em concreto, um ramo. Um carreiro de processionárias, uma almofada de musgo, líquenes. Uma pedra, outra pedra, e outra, e outra, e outra ainda. Pedras por todo o lado. (Estamos na montanha — what else?)
Chegados aqui, paramos — e nunca mais paramos. Pedras e líquenes ganham novos sentidos à luz do enquadramento fechado. O detalhe torna-se a paisagem, a microestrutura assume contornos de macroestrutura: ilhas, atóis, imagens de satélite. Mas também animais, tecidos, pinturas expressionistas, o Cosmos, o indefinível... O sentido estará nos olhos de quem vê e regista, mas a Arte está alhures: Nature did it, I just pressed “click!”
Tudo, porque um dia — uma vida? — foi preciso fugir da cidade. Desta cidade.

Nature's Munch Aventurando-se por solo lunar
Há lobos na serra Tempestade Solar

No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra.
Tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra.

(Carlos Drummond de Andrade)

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